Semana passada o festival Mutek Montreal chegou a sua 20ª edição. Durante 6 dias, o festival ocupou diferentes espaços da cidade, com uma programação voltada para produção audiovisual em torno do tema Arte, tecnologia e sociedade: imaginando futuros digitais.
Mais do que um festival de música eletrônica, o Mutek é um festival de arte digital, conectado com a experimentação e inovação – veja o nosso review da edição 2017.
Antes de continuar a leitura, uma perguntinha: topa viajar com a gente para uma cidade e um festival dos sonhos? Conheça os próximos destinos OCLB travel: SXSW (Austin), Sónar (Barcelona) e Primavera Sound (Barcelona).
Maratona Digital no Mutek Montreal
Cada espaço do Mutek Montreal é dedicado a uma experiência audiovisual diferente, todas conectadas pela linha mestra da vanguarda e inovação digital. A sessão Nocturne, considerada a espinha dorsal do festival, dividiu sua programação nas 6 noites e ocupou 3 palcos do Mutek. A/Visions, a sessão multissensorial voltada para apresentações audiovisuais, concentrou suas 3 apresentações no Teatro Maisonneuve.
O palco Expérience era o ponto de conexão entre festival e cidade, com apresentações gratuitas na Esplanade de La Place des Artes todos os dias no final da tarde, enquanto o Play abria espaço para shows experimentais. Forum IMG, Digi Lab e Sonic Circuits concentraram as atividades relacionadas com palestras, painéis e workshops, que aconteciam entre 9:00 e 17:00. A série Satosphere ocupou o edifício do SAT (Société des Arts Technologiques, um dos centros culturais mais importantes da cidade) com experiências audiovisuais imersivas e obras em realidade virtual.
O ISM Hexadome apresentou no Museu de Arte Contemporânea de Montreal 10 trabalhos criados especificamente para os 52 canais de audio e 6 telas de projeção da instalação 360º criada pelo Institute for Sound and Music Berlin. Na tarde de domingo, o Mutek uniu forças com o Piknic Életronique, evento de música eletrônica que acontece nos domingos de julho e agosto no Parc Jean-Drapeau. É uma programação de perder o fôlego – literalmente.
Novas formas de entender a dinâmica público-artista
A seleção de artistas feita pela curadoria do festival transita entre veteranos da música eletrônica e novos talentos ainda pouco conhecidos. A escolha dos espaços de apresentação evidencia a busca pela fluidez entre diferentes formas de expressão artística.
A cerimônia de abertura do Mutek Montreal ocorreu na recém-inaugurada PY1, um local de eventos em forma de pirâmide que possibilita projeções em 4 superfícies e não possui um palco propriamente dito. Sem um palco e com som 360º, desaparece o conceito de estar longe ou perto, desaparece o protagonismo do músico como ponto focal, o público ocupa o centro experiência audiovisual.
Inversões semelhantes do que seria a “hierarquia” tradicional das apresentações em festivais também acontece nas apresentações experimentais do Play. Em várias ocasiões, músicos ocuparam as laterais ou segundo plano do palco, deixando o ponto focal para os artistas responsáveis pela projeções e artes visuais.
Não, o Mutek Montreal não é um festival de música. De acordo Alain Mongeau, criador e diretor artístico do festival, o Mutek é um festival de resistência, que se distancia do que é comercial ou fácil e abre espaço para novas propostas e produtores que abrem caminhos para a criatividade digital.
Inteligência artificial e futuro digital no Mutek Montreal
A programação diurna do Mutek Montreal acompanha a mesma linha de raciocínio, com uma proposta muito além das festas e do entretenimento. O Studios des 7 Doigts – espaço de apresentações idealizado por um coletivo de 7 artistas que faziam parte do Cirque du Soleil – abriu espaço para o debate sobre o futuro da arte digital.
O foco eram alguns pontos específicos: influência da inteligência artificial no processo criativo, arte digital e experiências imersivas em museus, papel da arte digital e indústrias criativas em relação a questões sociais, ecológicas e sustentabilidade.
Quem paga a conta do Mutrek Montreal
O Mutek é quase totalmente financiado pelo governo e entidades culturais de Montreal. Ve-se muito pouco de ativação de marcas pelo festival. A ação mais evidente foi a parceria com a micro cervejaria local Brasserie Harricana, que lançou uma edição especial de uma cerveja em comemoração ao aniversário 20 anos.
A Red Bull apareceu como colaboradora, assinando a programação dos palcos Motion 1 e Motion 2, respectivamente nas noites de sexta e sábado nos Studios des 7 Doigts. O site Resident Advisor organizou alguns painéis, debates e sessões de curtas (em sua maioria documentários) no Centre Never Apart.
Já chegamos lá?
O painel “Are We There Yet?” levanta a questão até que ponto chegamos culturalmente, socialmente e politicamente nos últimos anos? A visibilidade de questões relacionadas a gênero, sexualidade e diversidade certamente afetou o teor das conversas convencionais, resultando em mudanças nas políticas institucionais e culturais. Música e arte muitas vezes tiveram papel central dando voz e criando espaço para esses debates, impulsionando mudanças sociais e culturais.
Na sua vigésima edição, o Mutek Montreal apresentou um lineup com 48% de artistas mulheres. O festival participa do projeto Keychange, uma iniciativa que tem como objetivo o empoderamento e desenvolvimento profissional de artistas que se identificam com o gênero feminino ou não-binário.
Além do Keychange, o Mutek participa do Amplify, iniciativa que envolve artistas de diferentes hemisférios socioeconômicos e políticos, e que usam sua arte e música para expressar e fazer mudanças. O painel de 2019 incluiu participantes do Reino Unido, França, Canadá e México, fornecendo uma visão ampla de como as experiências vividas variam em todo o mundo.