Ao lado do Tim Festival e a edição 2012 do Sónar SP, o Dekmantel Festival São Paulo foi o melhor festival de dance music contemporânea que já fui no Brasil. Daqueles que serão falados ainda por muito, muito tempo.
Diferente destes outros, porém, o festival holandês não foi produzido por uma grande produtora de eventos. Tampouco contou com grandes marcas patrocinando. Ou mesmo grandes headliners arrasta-multidões.
Aliás, é nesta palavra, “grande”, que o Dekmantel abriu um novo capítulo na história dos festivais no Brasil. Foi o primeiro grande festival de médio porte do Brasil. Não havia mais que 6 mil pessoas por dia. E isso fez toda a diferença.
Produção Impecável
Banheiros limpos, poucas ou raras filas. Sabonete líquido, água e papel higiênico até o final. Para as compras, o sistema cashless, de recarga nos cartões, funcionou perfeitamente. Não houve filas nos bares.
No sábado, durante a apresentação do Azymuth, caiu uma tempestade. A produção respondeu imediatamente. Distribuiu capas de chuva para a galera. No domingo, quando o sol apareceu castigando o meio da tarde, foi a vez do protetor solar com spray ser oferecido pela organização do evento gratuitamente ao público.
Até a cerveja foi especial. A oficial era a Stella Artois (R$ 12). Também havia a holandesa Hoegaarden (R$22), servida com uma fatia de laranja (o que reforçava o clima tropical do festival). Também tinha água de coco (Do Bem, R$ 12), opção inteligente e alternativa à água (R$ 7).
Para comer, os já esperados food trucks. Do japa ao veggie burger, do açaí com granola a smooths e sucos naturais. No quesito praça de alimentação, dá pra melhorar. Nada a reclamar, mas esse é um aspecto que os festivais brasileiros, em geral, ainda estão engatinhando.
Valem muitos elogios também o projeto cenográfico do festival. Todas as pistas foram muito bem caracterizadas, os bares seguiam uma mesma identidade observada ao longo do evento. O conceito natureza e tecnologia foi consistente com a identidade visual da comunicação pre-evento. Ponto para a produção!
E as marcas?
A ativação que mais chamava a atenção era do energético Burn, que montou uma agradável loja de discos no corredor do festival. Também havia um bar especial de drinks da Beefeater, marca de gin parceira das festas da Gop Tun em Sampa. E um container com cara de bar secreto, onde era possível comprar cigarros. Discreto e elegante, como quase todas as marcas no Dekmantel.
Liberdade Musical Define
“Não importa a teoria, o que importa é sentir”, gritou Hermeto Paschoal, improvisando uma letra de jazz enquanto chamava o público para cantar junto. Techno, house, electro, disco, soul, samba, R&B, jazz… Esqueça os rótulos. A liberdade de gêneros foi o ponto alto do festival.
Fiz um mini-review no meu perfil do Facebook sobre as apresentações do evento. Não vou me estender aqui sobre quem tocou o quê. O mais importante é dizer que o Dekmantel entregou o que prometeu. Uma rica e criativa diversidade de apresentações de altíssima qualidade.
Alguns pontos altos…
- O grupo paulista de jazz Bixiga 70. Potente, orgânico, enérgico. Deveria ser um headliner em todos os festivais do Brasil. Difícil dizer, mas foi provavelmente minha apresentação favorita do festival.
- O DJ set do sueco Kornél Kovács. Uma aula de house, do soulful ao progressive, do funk ao deep. Colorido, ensolarado e feliz.
- O live do holandês Fatima Yamaha. Preencheu com simpatia, beleza e calor o mainstage.
- O bailão do lendário produtor de Detroit Moodyman. DJ veterano, tocou Marvin Gaye, cantou em cima de bases, narrou o set pra galera e fez algumas das mixagens mais improváveis e tecnicamente perfeitas do festival. Que aula!
- O momento Hermeto Paschoal. Personificou o jazz, improvisou no teclado, cantou e contagiou a galera. Sem nunca deixar de lado sua taça de vinho tinto.
- A elegantésima Sassy J. Mixou Anderson Paak. com Milton Nascimento, quanta elegância! Me fez sentir como numa festinha de casa, mesmo dentro um festival.
- O back2back do Ben UFO e Joy O. Pra cima e contagiante, daqueles que te faz segurar o xixi pra não ter que sair da pista.
Quase tudo que escutei foi maravilhoso. Lena Willikens, Shanti Celeste, Zopelar, Carrot Green, Tom Trago e Palms Traxx também mandaram muito bem.
Não bateu…
- Nina Kraviz. Repetiu a mesma linha da sua elogiada compilação de 2016 pela Fabric. Techno underground, lenha e sem mimimi. Adoro techno, comecei a discotecar por causa deste gênero. Mas não acho que caiba o tipo de set que ela fez num sol de sábado de verão no meio de SP. Caverna demais pra um dia tão bonito e quente.
- Nicolas Jaar. Uma pena. O cara é um dos melhores produtores da atualidade. Mas faltou exatamente aquilo que é marca registrada de sua produção: equilíbrio entre os momentos de contemplação melódica e o vigor necessário pra fazer uma pista. Seu show foi um grande “bota fora”, apático e sonolento. Fiquei 45 minutos, desisti e depois soube que a apresentação ainda foi cortada de forma abrupta às 22h30, hora que todo o som do festival acabou de forma sincronizada.
E foi isso. Apesar destas duas bolas fora, o Dekmantel Festival São Paulo entregou uma experiência perfeita.
Antes de fechar as cortinas
Vale notar que o público do festival era um espetáculo à parte. Que vibe boa! Quanto estilo, gente interessante e disposta a colaborar para que a festa rolasse suave. Lembro de um momento, no banheiro, que um carinha quis furar a fila pra liberar a bexiga fora das cabines. Quando ele viu que nem eu e nem o camarada atrás de mim aprovamos a ideia, comentou: “Pois é… Puta festival lindo, produção foda, música animal… vamos respeitar, né?” 🙂
Recado aos Patrocinadores
O Dekmantel reuniu um grupo eclético de pessoas educadas, simpáticas e “antenadas” (na ausência de um adjetivo melhor). Tanta marca por aí patrocinando (ou tentando produzir) festivais genéricos… Espero que algumas possam ler este post aqui e separar parte da verba para a edição de 2018 *.
* Este autor não trabalha ou trabalhou com a produção do Dekmantel em nenhum momento. Pelo contrário. Gastou um dinheiro razoável, aproveitou o máximo que podia e ainda achou que saiu no lucro.