Ano: 2000. Enquanto parte do mundo ocidental preocupava-se com o “bug do milênio“, nos Balkans, região composta por países do sudeste europeu, o buraco era bem mais embaixo.
Diversas etnias que constituíam a antiga Iugoslávia estavam em guerra. Croácia, Eslovênia e Macedônia já haviam clamado independência. Bósnia e Herzegovina, Montenegro e Sérvia viviam sob regimes nacionalistas. Ao longo de 10 anos, centenas de milhares de pessoas foram mortas em conflitos armados.
Em meio a esta panela de pressão, um grupo de estudantes sérvios decide criar um movimento. Um festival. Com um poderoso slogan: “Exit out of ten years of madness” (a saída para 10 anos de loucura).
Assim nasceu, há 18 anos, o principal e maior festival da Sérvia: o EXIT Festival.
Mais que um festival, um movimento
Mais que um festival, o Exit orgulha-se em ser um movimento político. Um agente de mudanças, inspirado nos valores de liberdade, paz e amor, para um mundo melhor.
Novi Sad, a cidade onde acontece o festival, é a segunda maior da Sérvia (atrás apenas de Belgrado). Foi eleita uma das três “Capitais Europeias da Cultura de 2021”. Sim, o Exit Festival é responsável pela premiação.
Anualmente, centenas de milhares de pessoas participam do Exit. Em 2017, 215.000 pessoas estiveram nos 4 dias de festival! Muitos são turistas, como nós, que depois de conhecerem a cidade e o festival, voltam aos seus países com uma nova ideia do que é a Sérvia.
É a prova de que quando um festival e a política local andam juntos, todos saem ganhando.
De cara, posso afirmar que nunca conheci um povo europeu mais cordial, simpático e aberto para um papo que os Sérvios. Falar que você é do Brasil é ganhar um sorriso de orelha a outra. Tive a sorte de fazer amigos neste festival que espero manter contato por muitos e muitos anos.
Novi Sad também é uma cidade charmosa, com restaurantes e cafés deliciosos, por onde passa o Rio Danúbio e cujos preços são razoavelmente baratos, até mesmo para nós que ganhamos em real.
E ainda tem o lugar do festival…
Uma fortaleza no meio de uma ilha
O Exit rola na Fortaleza Petrovaradin, construída no século XVII, no meio de uma ilha, rodeada pelo rio Danúbio. Sim, é uma paisagem ES PE TA CU LAR. Nunca estive num festival em um lugar tão surreal.
Embora lotadíssimo – pense num Lollapalooza ou Rock in Rio no dia mais cheio – chegar e sair de lá é tranquilíssimo. O táxi é barato. Estávamos há 4km do festival e pagamos cerca de R$ 12,00 (na bandeira 2).
Você também pode acampar no festival, se conseguir arrumar uma vaga (dica: tente com pelo menos uns 3 meses de antecedência).
O Melhor Maior Festival Europeu
O Exit anuncia no line-up 18 pistas. Tem de tudo: reggae, trash metal, hip-hop, música latina (rolou uma performance de samba na abertura do festival), rock, chill out, folk, música eletrônica de todos os tipos e grandes shows que rolam no mainstage (2018: Grace Jones, Ziggy Marley, Fever Ray, David Guetta, French Montana, Migos etc).
Pra ter uma ideia de como é grande, estivemos em três dos quatro dias de festival e ainda não temos certeza se vimos todos os palcos. No terceiro dia, descobrimos vários que não conhecíamos. Só de música eletrônica há quatro diferentes. Existe um “mainstage” só de techno e house, por onde tocaram Solomun, Maceo Plex, Carl Craig etc.
Em 2017, o Exit concorreu com outros 350 festivais e levou o prêmio de Maior Melhor Festival Europeu pela EFA (European Festival Awards). Ele faz questão de mostrar que é grandioso.
Os fogos de artifício na abertura do festival podem ser comparados a um mini Réveillon de Copacabana. Foram pelo menos uns 20 minutos de “show”.
Ou seja… é um festival superlativo. Tudo é gigante! Sério, dentro da Fortaleza tem até um hotel 5 estrelas!
Outra dica: apesar de “veteranos” (ou por isso mesmo), rola uma canseira. Para se deslocar nas pistas, é um sobe e desce sem fim.
Detalhes que fariam diferença
Alguns ajustes poderiam ser realizados para que o festival fosse perfeito:
– Circulação no mainstage: definitivamente não cabe no mainstage a quantidade de pessoas que o festival coloca pra dentro. Nos principais shows, a circulação ficava restrita e desagradável (principalmente se você quer ir para as pistas eletrônicas, que ficam atrás do mainstage). Muita gente espremida, outras tentando achar um caminho para passar. Não rola curtir o show de boa. Não vi um show no mainstage sem passar perrengue.
– Mais opções de comida e bebidas: praticamente não havia outras bebidas no festival senão cervejas (vendidas em latão de 0.5ml). Não vi destilados ou drinks. Tinha vinho, mas não vi ninguém bebendo. Quanto à comidas, de forma geral o festival entrega uma experiência bem inferior comparado a outros festivais do mesmo porte. No Pohoda (Eslováquia), um festival de médio porte, era possível encontrar comida indiana, tailandesa e vegetariana, além do tradicional hambúrger, pizza e sanduíche. Com tanto restaurante bacana em Novi Sad, este ponto um fail.
– Horário: é um festival noturno, que começa às 21h (o portão abre à 19h). Mas grande parte do charme do lugar é o dia. Tudo bem, faz um calor dos infernos… mas quando cai a noite, o lugar fica escuro demais, é muito pouco iluminado e parece uma grande rave. Valeria a pena o festival começar mais cedo, com mais atividades voltadas para famílias (e fãs de festival com mais de 30 anos)
Apesar dos pontos acima e das 100 mil pessoas x dia, os serviços do festival funcionaram super bem.
O sistema de cashless rolou de forma rápida e eficiente. Os bares e banheiros não tinham filas (quando tinham, era só andar um pouco mais pra achar outro por perto vazio). E a simpatia e educação dos atendentes dos bares, seguranças e produção do festival foi uma das melhores que vi na vida.
Vida longa ao Exit Festival. Que o movimento continue se expandindo.
Precisamos de mais festivais como esse no mundo.