Entrevista: Picnik no Calçadão ou Como Ressignificar Espaços Urbanos Através da Cultura


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Picnik no Calçadão volta com a sua versão festival nos dias 2 e 3 de julho em Brasília, mais precisamente na Concha Acústica do Calçadão Asa Norte (daí o novo nome Picnik no Calçadão), e traz no line-up expoentes da música nacional alternativa, como o Horos, projeto de Bruno Belluomini; Enema Noise, Muñoz Duo, Forro Red Light e My Magical Glowing Lens, entre outros.

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Imagens: Tomas Faquin

Como já é a cara do evento, a versão 2016 do Picnik contará com uma programação diversa: feira de discos, praça de alimentação com opções que incluem até produtos orgânicos e veganos, expositores das áreas de moda, decoração e arte; atrações circenses e teatrais; workshops ministrados por nomes de peso como Perestroika (“Processo Criativo”), Sobre Urbana (“Oficina de Banco de Palet”) e Marcelo Costa, do Scream & Yell (“Escolas Cervejeiras” e posterior degustação da bebida), e até um espaço para debates e discussões acerca de temas que envolvem a música independente local e as intervenções urbanas cada vez mais crescentes pelo país.

Como se não fosse o bastante, o evento entrou de cabeça na onda dos festivais que prezam pela espiritualidade (leia: Expandindo Consciência e Espiritualidade: Um Mergulho nos Festivais Transformativos) e também terá sua própria área zen, com sessões de meditação e yoga, workshops de bordado de mandalas, e também um espaço bem interessante que promoverá trocas e práticas sobre astrologia, cultura indígena e terapias alternativas.

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Imagem: Ana Lucena

O diferencial do Picnik, entretanto, se dá através de seu formato: com entrada franca, o que também inclui boa parte das atividades oferecidas, o festival é considerado um dos pioneiros a ocupar espaços urbanos e consegue mobilizar boa parte da cidade (leia: Primavera Sound ou Como Ocupar uma Cidade com um Festival) durante seu período de realização.

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Imagens: Tomas Faquin

Para entender um pouco mais dessa história e de como o Picnik se tornou um dos mais completos festivais do país, falamos com Miguel Galvão, o idealizador de tudo isso, e você confere o papo logo abaixo.

(PULSO) Como surgiu a ideia do Picnik? Conta pra gente um pouco da história do festival e da evolução com os anos?

Miguel Galvão: O Picnik nasceu em 21 de abril de 2012, mesmo dia do aniversário de Brasília. Tínhamos vontade de criar uma plataforma de encontro diurna entre pessoas de diferentes grupos e classes, que valorizasse a realidade presencial (em detrimento da virtual), dispensasse a presença de álcool e proporcionasse uma oportunidade de consumo oposta a que encontramos normalmente nos shopping centers.

Na época, o pessoal da Administração de Brasília (que funciona como espécie de Prefeitura), nos procurou para pensar um projeto para o Calçadão da Asa Norte, espaço público recém-inaugurado com localização privilegiada (na beira do Lago Paranoá) mas que era desconhecido pela população e já estava sendo tomado por marginais. A ideia logo se encaixou perfeitamente com o local, mas faltava a forma de viabilizar financeiramente… Observamos uma onda de brechós que nascia muito forte na cidade e assim trouxemos o mercado alternativo para dentro do evento, onde expositores contribuíam com o custeio.

Musicalmente nossa pegada sempre foi mais para a música eletrônica, até porque muitos dos envolvidos são DJs. Mas a intenção sempre foi desconstruir aquela imagem estereotipada bombação-sem-camisa-óculos-escuros que afasta um bando de gente legal do segmento.

A música não era a protagonista na hora de falarmos previamente com o público (para esse deixar seus preconceitos em casa): ela entrava como pano de fundo e ia envolvendo os presentes, até desaguar numa bela pista de dança true-house-music-style.

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Imagens: Tomas Faquini

(PULSO) Quais as diferenças dessa edição pras outras que rolam ao longo do ano?

Miguel Galvão: Depois de um ano de evento, a gente já estava fazendo coisa para 6 ou 7 mil pessoas. Daí tivemos a oportunidade de ocupar o CCBB, um espaço super respeitado aqui na cidade, quando resolvemos estender o conceito do #feitoembsb também para a programação musical, proporcionando um primeiro mini-festival independente. Na ocasião, estourou, tivemos shows de nomes importantes como Lucy and The Popsonics e Sexy Fi, galerinha toda que estava na ativa tocou, rolou uns momentos mais experimentais também que surpreenderam o público e tal. Vimos que isso podia ser uma boa oportunidade.

Ainda em 2013, fizemos um Queremos! (leia: Entrevista: Quisemos, Queremos, Quereremos!) para viabilizar outro mini-festival, novamente com foco na música autoral, misturando sempre locais com bandas alternativas que respeitamos de outros estados, provocando intercâmbio de referências e tal. A gente viu que isso movimentava a cena, dava um palco bom para galera que já tá fazendo um som legal e apresentava eles para um público apto a se relacionar com aquilo.

Em 2014, fizemos uma outra edição nessa pegada, na Ermida Dom Bosco, onde a ideia era vender para o público que é muito massa a onda de ter bandinha e tal. O apetite da galera que frequenta sempre é enorme! By the way, novamente virou via crowdfunding.

A ideia sempre foi impulsionar a cidade para que tivéssemos bons artistas produzindo boa música aqui, se expressando baseado no nosso cotidiano, em nossas paisagens, para cidade atingir uma linguagem musical de alto nível e própria.

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Imagem: Raquel Pellicano

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Imagens: Tomas Faquini

Como em geral só fazemos edição com bandas 1x por ano, em 2015 resolvemos que essa seria o único formato especial festival com 2 dias de duração do Picnik, e assim fizemos na Praça dos Cristais o que, para muitos, foi a melhor edição até hoje, com shows do Boogarins, Garotas Suecas e também do grupo francês Poni Hoax, além de mais umas 14 bandas e pista de dança, tudo num lugar incrível, onde é muito raro de ter atividade.

Em novembro, tivemos a oportunidade também de trazer o Mac DeMarco para a cidade. Só que a gente viu que a única plataforma que conseguiríamos viabilizar seria via Picnik, até porque seria incoerente com nossa história promover um show desses, que sintetiza muito da estética que gostaríamos de disseminar para a cidade, para uns 300 felizardos cobrando R$200 de entrada. Por isso, botamos quase todo o lucro do ano e fizemos outro mini-festival, num evento lendário.

Nesse ano, a intenção era de concentrar ainda mais energia nesse formato, só que a crise e o cenário político atrapalharam bastante nossos planos. Mas continuamos içando velas e colocando o barco na água, pois navegar sempre foi preciso. Demos alguns passos para o lado, tivemos de achar um novo local e fechar novas parcerias.

(PULSO) Já que o festival é gratuito, como é a relação com os patrocinadores, como a Coca-Cola? No que eles interferem? Como funciona essa dinâmica?

Miguel Galvão: A interferência deles é muito pouca, inclusive no quesito financeiro. Mesmo sem bilheteria, somos totalmente independentes, pois os nossos expositores ajudam a custear todo o projeto, até no cachê das bandas e tal. Nossa troca com o público é do seguinte modo: se você quiser continuar vendo esses shows fodas de graça, prestigie quem está pagando por eles, ou seja, galera do mercadinho. 

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Imagens: Tomas Faquini

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Imagem: Ana Lucena

(PULSO) O que você acha dessa nova onda de ocupação em espaços públicos? Como você acha que isso agrega a esse tipo de evento? Pra você, configura uma nova tendência?

Miguel Galvão: Acho que tão tentando hypar uma coisa que, pelo menos aqui em BSB, já acontece há muito tempo… Festa na rua já tem há quase uma década. O lance é expandir e parar de concentrar a energia só em festa, aí é que está o barato para gente.

No Brasil, perdemos muito energia canalizando energia só para farra, entende? Encaramos como uma oportunidade de levar possibilidade de socialização rica e diversa, com vários tipos de interação, criando vínculo do público com aquela localização. O propósito é que assim ele ajude a conservar mais, respeitar mais, frequentar mais. Ressignificar o espaço e também posturas.

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Imagens: Tomas Faquini

(PULSO) Em relação às palestras e workshops, como surgiu essa ideia? O que você espera acrescentar ao festival com essa novidade?

Miguel Galvão: A gente olhou para programação e viu um monte de “autoridade”, nomes com bastante bagagem na cena alternativa e daí resolvemos aproveitar mais o cachê que estávamos pagando (risos). A pegada é dar referência mesmo para a cena local e a turma que está começando, trazendo cases de sucesso para serem compartilhados, os acertos, erros, particularidades e tal, tudo de uma maneira bem objetiva mesmo.

O espectro é amplo, pois tem um artista foda falando sobre a parte business por trás de sua carreira (Lucas Santtana), um selo musical em ascendência (Honey Bomb Records, de Caxias do Sul), um canal de conteúdo de alto nível dedicado à musica independente (Scream & Yell) e uma label de festas que fez história no underground disseminando o dubstep no Brasil (Tranqueira).

(PULSO) Por fim, como você faz a curadoria do line-up e também das outras atividades? O que você leva em consideração na hora dessas escolhas? 

Miguel Galvão: Curadoria é muito importante. Buscamos criar uma história coerente com o que queremos valorizar na cidade e com horizontes musicais que gostaríamos de fortalecer e/ou ver mais presentes por aqui. Daí pegamos isso e montamos de uma maneira que fique agradável para o público que vem pelo evento e não por conta das bandas, mas por conta do projeto mesmo, de modo a despertar uma curiosidade positiva na galera. Aí vamos jogando na loucura que realmente queremos dar de “input” na cidade.

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